Príncipe do Valle del Sinú
Seus sentimentos mais leves que as asas das garças
porém fortes como seu voo Sua virilidade a própria
de um príncipe masculino sonhador e altivo Sua índole
a do que não queria amar mas ama Sua posse
a terra Os míticos zebus brancos e avermelhados
Uma carruagem de madeira e metal violeta escuro
como seus olhos Tem a noite de Damasco neles
Sua voz a do trovão diluído no sussurro da brisa
Sua elegância a do cavalo do deserto Suas maneiras
a presença dos antepassados orientais fumando
o haxixe Batendo o ar com as pestanas negríssimas
com um fundo púrpura de olheiras de adicto ancestral
Deitado sobre uma almofada de seda verde pistache
Seus alimentos as amêndoas As azeitonas O arroz
A carne crua com cebola e trigo O pão ázimo
As uvas passas O gergelim O coco O iogurte ácido
Suas cores o preto O azul e o magenta
Seus elementos o ar e a terra Sua presença
a de um jovem deus agrícola afastando o mal inverno
Oferecendo sua força ao fraco do campo Sua essência
íntima a do adolescente eterno que habita
a ilusão do poeta e sua loucura de alcançá-lo
em seu pleno trânsito fugaz à madurez
familiar aos hábitos pouco felizes
Seu sentido unânime o da flecha e o coração palpitante
da agonia do êxtase erótico Seu prazer o transbordamento
íntegro do ser sobre meus sonhos abandonados entre suas mãos
Sua eternidade em mim a do amor amplamente desejado
no essencial de cada instante De cada poema
O que soube medir suas próprias distâncias
Parece uma estátua de areia
em plena preamar
e não se derruba
Será porque é de choro leve
e emoções de certeza
Ou porque desde menino
ouviu cantar a sereia
Parece um delicado peixe
de íris e de escamas
estendido na ribeira
e não se afoga
Será porque soube
que o amor é
o pior inimigo
do amor
Ou porque escreveu
em longas noites
palavra trás palavra
E logo não lhes concedeu
demasiada importância
O que não entendeu nunca
Foste uma testemunha indolente
Nem compreendeste
Nem ajudaste a vítima
Foste um cúmplice da perfídia e da ignorância
Tacitamente aceitaste
que aquele homem não valia a pena
Quando o levavam ao matadouro
estavas perto dele
e apenas olhadas de rancor lhe prodigaste
Quando te perguntaram
se aquele amigo que aparecia em seus poemas eras tu
o negaste raivoso
Hoje que vives entre coisas cotidianas
te esqueces daquela época ilustre
quando aos teus pés tiveste a poesia?
Equilíbrio
Às suas costas Veio forte
Amores desditosos de minha vida Os mais
Me construí poderoso e sonhador
e com vocês ficaram
os fiapos inaudíveis da minha poesia
Seres queridos
De corpos intocados
De peles adoradas
Seres que me preservaram do desterro da carne
ao exercitar em mim a sexualidade amorosa
Seres inabitáveis Assim me davam gosto
Eles me ensinaram que quando se amam assim
se perde
e que quanto se perde no amar
se ganha em alma
Ação de graças
Como um deus sábio que sabe perdoar seu poeta
me defendeste até do próprio esquecimento
em que pude para o meu mal deixar-te
Apaziguado males que o ofício pressagia
Outorgado carícias que jamais sonhei
Ó deus! Te entrevi na jornada rarefeita
de lhe confiar ao papel a vida e seus enganos
Olhaste em minha alma e seus duros trabalhos
um presente ao eterno que há em ti
Ao indizível do teu manso poder
que faz com que a tua beleza seja como frescura
na dura prova do poema inacabado
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