revista fevereiro - "política, teoria, cultura"

   POLÍTICATEORIACULTURA                                                                                                     ISSN 2236-2037

Daniela MOUNTIAN

leonid dobýtchin

 

nota biográfica

 

Como acontece em grande parte dos contos de Leonid Dobýtchin (18941936), em “O marinheiro” (1927) vislumbramos a iconografia que nascia com a Rússia soviética contraposta a cenas de um cotidiano miniaturizado, grotesco e provincial, no qual gatunos roubam roupa de baixo e vacas são conduzidas pelas ruas da cidade. Entre estandartes e Pioneiros surge a imagem majestosa do marinheiro perpassada pelo olhar pueril de Liochka, que vê nos músculos inflados daquele o pão branco trançado da casa de chá de Siliébina. Os enredos dos contos de Dobýtchin obliteramse, são superados por imagens flutuantes como as reiteradas bandeiras sobre as cabeças de seus heróis amorfos, quase vultos, ora atropelados por um desfile, ora sozinhos sob uma meialua furtiva, pesada e opaca.


Leonid Dobýtchin, ao lado de nomes como Daniil Kharms (19051942), Evguéni Zamiátin (18841937) e Boris Pilniák (18941937), foi um dos expoentes do modernismo russo, por muitos comparado a Velímir Khliébnikov (18851922) e Bruno Schulz (18921942).


Leonid Ivánovitch Dobýtchin nasceu em Dvinsk (atual Daugavpils, Letônia) no ano de 1894. Nada se sabe de sua infância, a não ser que perdeu o pai, um médico, ainda menino. Ele formouse no Instituto Politécnico de São Petersburgo e por quase toda a vida trabalhou como estatístico em cidades do norte da Letônia e da Rússia, dividindo quartos de solteiro com a mãe, que era parteira, um irmão e duas irmãs. Distante de Petersburgo, ele se manteve numa vida solitária – seu contato com o mundo literário resumiuse às correspondências que trocava com seu editor e com o escritor Kornei Tchukóvski (18821969). Somente aos 40 anos, pôde escrever numa escrivaninha própria, quando recebeu da União dos Escritores um quarto num apartamento comunal de Petersburgo, então Leningrado.


O motivo de sua morte permanece desconhecido, suspeitase de suicídio. Em janeiro de 1936, numa reunião da União dos Escritores de Leningrado, logo depois do repúdio público de Stálin ao compositor Chostakóvski, Dobýtchin, acusado de ser o maior “formalista” entre os escritores e politicamente míope, foi considerado um inimigo da classe, fato que, talvez, tenha sido agravado por sua homossexualidade e pela figura um tanto voluntariosa. Ele defendeuse de todas as acusações e desapareceu no dia seguinte. Nunca mais ninguém o viu.


Em vida, Dobýtchin publicou duas coletâneas de contos, Encontros com Liz (1927) e O retrato (1931) – reunidos no livro Encontros com Liz e outras histórias (Kalinka, 2009) – e o romance A Cidade N (1935). Escreveu mais dois livros, publicados anos depois de sua morte, Os Selvagens (1989) e O Clã do Churka (1993), que recebeu o prêmio “Internacional Book of the Year” do Times Literary Supplement de 1994.


Hoje aclamado mundialmente, o nome de Leonid Dobýtchin desapareceu na década de 1930 e só foi redescoberto depois de 1990, junto com uma safra de escritores modernistas russos obscurecida pela censura da era stalinista.































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