POLÍTICATEORIA
CULTURA
ISSN 2236-2037
Ruy FAUSTO (com agradecimento a Cícero ARAUJO) [i] |
em torno da insurreição de 1917 e dos seis primeiros meses do poder bolchevista |
(1ª parte) |
Introdução – A história da insurreição de outubro de 1917, e dos primeiros tempos do poder bolchevista, foi, desde sempre, mais ou menos mitificada. A versão leninista, ela mesma já bastante enganosa, deu lugar, à medida que Stálin começava a sua carreira vitoriosa, a uma versão falsificada, e depois fantasiosa, no estilo das produções ideológicas do stalinismo. Com a contestação krushevista e depois gorbatcheviana de Stálin, apesar dos limites e dos interregnos de recuo, liberouse de certo modo a antiga versão leninista, menos fantasiosamente falsificadora, mas de qualquer modo pouco objetiva. A atividade crítica da historiografia antileninista (liberal e socialista nãoleninista), que data pelo menos dos anos 30, e já tem portanto, uns oitenta anos de existência, foi muito salutar. Não, entretanto, sem ter dado respostas às vezes unilaterais, às vezes simplificadoras, no seu afã de desconstruir a versão oficial. Não entrarei aqui no detalhe da historiografia sobre a insurreição de outubro (digase de passagem, na discussão dessas leituras, a versão tomada como tradicional é a que questiona as teses bolchevistas, e a que as tenta, mais ou menos reabilitálas, é chamada de “revisionista”; mas esse ponto – não, claro, a própria discussão – remete a um problema de terminologia). O presente texto é uma versão muito reduzida de um trabalho de mais fôlego. O balanço crítico que comecei a elaborar tomou dimensões incompatíveis com uma publicação em revista. Na impossibilidade de publicar aqui o texto completo, apresento uma discussão das questões essenciais, deixando de lado uma parte da sua fundamentação “empírica” (as aspas remetem ao fato de que utilizei principalmente, mas não só, é verdade – já que há fontes primárias traduzidas[ii] – fontes secundárias). De qualquer modo, espero ter fornecido o essencial das referências que fundamentam as teses aqui apresentadas. Mais do que isto, além do que já fornece o corpo do artigo, decidi interpolar no texto, na forma de quatro excursos, cujos temas são indicados, um material (em geral) narrativo relativamente amplo.[iii] É que a história dos anos 19178 na Rússia é, apesar das aparências, muito mal conhecida e, como já disse, obscurecida por mitos persistentes. A acrescentar que os detalhes e a microhistória têm, aqui pelo menos, uma importância muito maior do que a que se supõe. Pode dizer, que, sem ela, é difícil entender o que foi a política do bolchevismo (a de Lênin e Trotski, em particular), nos anos 191718. 1. Seria possível esquematizar os problemas principais que se colocam, quando se pretende refletir sobre a insurreição de outubro de 1917 e sobre o que ocorre no primeiro semestre de 1918. As questões são essencialmente as seguintes. A insurreição de outubro de 1917 foi uma verdadeira revolução? Ou foi, como pretenderam alguns historiadores e homens políticos – de direita, e de esquerda nãoleninista – mais um golpe de Estado do que uma revolução? Pergunta já antiga, e que merece discussão. A segunda questão é: porque razões o poder estabelecido em outubro (novembro) de 1917 era constituído apenas por membros do partido bolchevique? Ou seja, por que, ou em que condições, a insurreição de outubro leva ao poder um governo de um só partido? Tais perguntas remetem aos acontecimentos que antecedem o movimento de outubro, e ao processo do próprio movimento. As questões seguintes, de igual, ou talvez de maior importância, remetem ao que ocorreu no período de outubro (novembro) de 1917 a junho/julho de 1918. Elas são essencialmente duas. Por que razão ou razões, o poder bolchevista evolui, ou involui, em alguns meses, de um regime de estilo autocrático, mas no interior do qual subsistiam certos espaços de liberdade, para um regime autocrático fechado? Essa mudança decorre da irrupção da guerra civil, como se pretende frequentemente? E, segunda pergunta: qual o curso que tomam as relações entre as massas populares e o bolchevismo, no período que vai de outubro (novembro) de 1917 a junho/julho de 18? A base popular do bolchevismo aumenta, como se pretende frequentemente, ela se mantém no nível alcançado em outubro, ou ela se deteriora substancialmente? Eis aí o quadro das questões. Dados os limites desse texto, não poderia desenvolver muito a discussão, e, como já observei, as referências às fontes têm de ser mais ou menos limitadas. 2. Para a interpretação bolchevista tradicional, nada poderia parecer mais abstruso do que pôr em dúvida o caráter de “revolução” do movimento de outubro. Entretanto, o problema é menos simples do que parece. “Revolução” se opõe, em geral, a “golpe de Estado”. Marc Ferro, autor de uma história da revolução de 17, afirma em algum lugar que, em outubro de 1917, houve as duas coisas. Revolução e golpe. Mas essa resposta é ela mesma ambígua. Que houve “golpe de Estado”, no sentido de que houve uma preparação militar vinda de cima para se apossar do poder, não é negada nem por Trotsky, na sua História da Revolução Russa. A questão é saber se esse “golpe de Estado” responde ou corresponde ao lado “revolução” do processo (se supusermos que houve também esse lado), ou se pelo contrário, ele, de algum modo, se lhe opõe. Há razões para pôr em dúvida (ou “atenuar”, de alguma forma) o caráter de “revolução“ do processo de outubro . A participação popular foi muito pequena. Trotsky fala numa participação total ativa máxima de 25 mil a 30 mil,[iv] o que, observa o historiador Orlando Figes, representaria “mais ou menos 5% de todos os operários e soldados da cidade”. Claro que se poderia discutir a importância do número de participantes. Mas observese, na revolução de Fevereiro, havia algumas centenas de milhares de pessoas na rua.[v] Dirseá que isso é normal, na medida em que Fevereiro foi uma revolução de muitas classes, enquanto que outubro teria sido uma revolução operária. O problema é que, em Fevereiro, já no dia 23, havia uns 100 mil operários na rua,[vi] “um terço da força de trabalho industrial da cidade”. No dia 25, havia uns 200 mil.[vii] A diferença em relação a outubro é muito grande. E observese que os 25 ou 30 mil participantes em outubro, de que fala Trotsky, representam o conjunto dos participantes ativos. Na famosa tomada do Palácio de Inverno, teria havido menos do que 15 mil, talvez bem menos.[viii] Como se sabe, a vida da cidade funcionou mais ou menos normalmente durante o episódio insurreicional. Enfim, se “revolução” indica uma grande mobilização de massas, outubro não foi uma revolução. Entretanto, é verdade que os bolcheviques tinham apoio popular, de soldados, marinheiros e operários. Eles haviam conseguido maioria no soviete de Petrogrado, em setembro e também no de Moscou, e as eleições para as dumas mostram o seu progresso. Por outro lado, eles seriam majoritários no Segundo Congresso PanRusso dos Soviets, que se abre no momento mesmo do movimento de outubro (inicialmente – antes da retirada de mencheviques e SocialistasRevolucionários (SR) – os bolcheviques tiveram maioria relativa; absoluta, só com seus aliados SR de esquerda). Mas, além do fato de que a maioria popular de que eles dispunham se manifestou muito pouco em outubro, aqui abremse alguns problemas (em parte já invadindo a segunda questão). O primeiro é o de saber o que queriam os eleitores do partido bolchevique, assim como os delegados aos sovietes e ao Congresso dos Sovietes. Certamente, eles queriam o fim do Governo Provisório. Porém, a esquerda menchevique dirigida por Martov também o queria, e também a esquerda SocialistaRevolucionária (além de outros grupos da esquerda da esquerda). Mesmo o Préparlamento[ix] havia votado uma moção de desconfiança em relação ao Governo Provisório. Mas essas maiorias dentro e fora dos sovietes, queriam um governo bolchevique, e, mais especificamente, só bolchevique? Tudo o que se sabe leva à idéia de que o que eles queriam era “um governo dos sovietes”, sem dúvida um governo não coinciliacionista dos sovietes, mas um governo que não fosse só do partido bolchevique. Inversamente, majoritário ou não, Lênin não pensa em manifestações de massa, e quanto aos sovietes e, particularmente, ao Congresso, fora um curto episódio sobre o qual voltarei logo mais adiante, ele não pretende, de modo algum, ser alçado ao poder através desses órgãos. Excetuando o referido interregno, ele conspira ativamente, e trata de convencer o seu partido de que é preciso não só tomar o poder, mas de que é necessário tomálo antes do Congresso dos Sovietes (como se sabe, Trotsky diverge, ele quer que as duas coisas coincidam, o que, por razões que veremos, acaba acontecendo). Poderseia perguntar: se Lênin convocasse as “massas” para grandes manifestações, elas teriam saído à rua? Se ele as tivesse convocado, certamente teria havido mais gente na rua, mas é duvidoso que houvesse muita. Há certa convergência, na idéia de que havia um refluxo do movimento de massas. Porém, o essencial é que ele não convocou. Ainda mais importante, por que Lênin quer tomar o poder antes do Segundo Congresso? A resposta que dá Figes parece convincente. Quaisquer que fossem os riscos, Lênin queria ter as mãos livres para governar, e não depender dos sovietes. Um governo indicado pelos sovietes teria de ser, de algum modo, um governo de coalisão. Ora, se os bolcheviques tomassem o poder antes do Congresso, haveria possibilidades bem maiores de que esse governo fosse um governo só do partido bolchevique. Lênin nunca deixou dúvidas sobre o problema de saber como ele gostaria que os bolcheviques governassem. A posição de Trotsky indicava uma diferença importante? Trotsky estava um pouco mais interessado em legitimar o poder bolchevique pelos sovietes, mas aparentemente não tinha uma perspectiva muito diferente da de Lênin. Aqui, já entramos na segunda questão. Por que o governo que é entronizado em outubro é apenas bolchevique? A perspectiva de Lênin até as jornadas de julho é a de tomada do poder pelos sovietes (ou pelo menos a palavra de ordem é “todo poder aos sovietes”). Ele a retira, em seguida, porque considera que os sovietes se passaram para os moderados, para recolocála em setembro, quando os bolcheviques se tornam majoritários. Em setembro, há um momento em que ele considera possível uma tomada do poder através dos sovietes, com a participação de outras tendências (SR de esquerda e mencheviques internacionalistas, essencialmente). Kamenev, o melhor representante dos bolcheviques moderados tenta um acordo, e Lênin o apoia, isso no começo de setembro. Em quê tal tentativa poderia redundar não sabemos. Supondo que o acordo se fizesse – e em que bases ele se faria? – é de se perguntar como se comportariam os bolcheviques nessa coalisão. Mas fracassada essa tentativa, seu projeto passa a ser o de um governo apenas bolchevique, ou, em todo caso, um governo em que os bolcheviques teriam as mãos livres. Sabese o que aconteceu depois.
Formado o Comitê Militar Revolucionário dominado pelos bolcheviques, o qual vai assegurando poder sobre a tropa, Kerensky reage tentando fechar dois jornais bolcheviques. Começa uma mobilização de soldados e guardas vermelhos (os guardas vermelhos eram destacamentos de operários, constituídos no início, independentemente, mas que logo cairão sob o controle dos bolcheviques). Quando começa o Congresso dos Sovietes, a cidade já está praticamente nas mãos dos adversários do Governo Provisório, que subsistia ainda, entretanto, apoiado por pequenas tropas, no Palácio de Inverno. Na sessão do Congresso, Martov propõe um governo com representantes de diferentes tendências revolucionárias. A proposta é recebida com apoio esmagador. Mas aí, protestando contra o movimento, socialistasrevolucionários de direita e mencheviques de direita se retiram. Martov fica e propõe, de novo, uma coalisão. Trotsky faz então o seu famoso discurso jogando todos os adversários do bolchevismo “na lata de lixo da história”. Martov e os mencheviques internacionacionalistas se retiram então. Os SR de esquerda ficam, mas não aceitam participar do governo, porque querem um governo de coalisão ampla (eles entrariam no governo em dezembro, e ficariam até março). Aqui evidentemente entra a discussão do papel da direita menchevique – que foi majoritária no partido até outubro –, e dos socialistasrevolucionários de direita. Se a formação de um governo exclusivamente bolchevique é lamentável, e se ela se deve certamente ao “vanguardismo“ de Lênin (e também de Trotsky, mas não de todo o partido bolchevique), ela se deve também, é claro, à política ilusória, para não dizer mais, de mencheviques e socialistas revolucionários, que insistiam na aliança com os liberais (o problema da aliança com os liberais é que ela impedia toda tentativa de responder de uma maneira mais satisfatória à ofensiva radical de operários e camponeses : o insucesso das tentativas de fazer uma política mais radical, por parte do líder SR Tchernov no ministério da Agricultura, e do menchevique Skobelev no ministério do Trabalho, o comprovam).
Retomando o tema principal, e resumindo. A dificuldade em considerar o movimento de outubro como “revolução”, vem, em primeiro lugar, da escassa participação das “massas” no movimento. Esta seria compensada pelo fato de que, efetivamente, os bolcheviques tinham apoio da maioria dos operários, apoio manifestado nas eleições para as dumas, para os sovietes e o Congresso. Mas esse elemento justificante é, por sua vez, atenuado pela circunstância de que as “massas” e também as delegações em sovietes e no Congresso, eram muito mais antiGoverno Provisório (e prósoviete), do que propriamente favoráveis ao bolchevismo (e a fortiori a um governo só bolchevique). Lembremonos de que a palavra de ordem do bolchevismo era de novo “todo poder aos sovietes”, não “poder ao partido bolchevique” (como seria o caso, mutatis mutandis, com o partido nazista). Há assim uma descontinuidade entre o movimento de massas e o movimento de outubro, que torna difícil empregar sem mais o termo “revolução”. Porém, a idéia de golpe de Estado – pelo menos sem maiores explicações – é insuficiente, porque havia um amplo movimento, ou pelo menos uma “ampla atitude” de oposição ao Governo Provisório. Mas como esse movimento era, assim, antes antiGoverno Provisório do que próbolchevique (ou próbolchevique, mas só na medida em que o bolchevismo era o movimento que queria “o poder dos sovietes”), podese falar no “qüiproquó” de outubro, como escreve o historiador francês Nicolas Werth. E o que vem depois vai reforçar a tese do quiproquo. O pósoutubro revela como era frouxo e superficial o apoio “positivo” ao bolchevismo, até onde ele existia. E como o bolchevismo poria a seu serviço, da forma mais brutal, o movimento de outubro. O que aconteceu depois ilumina, retrospectivamente, o que se passou antes e durante outubro. Por outro lado, a maneira pela qual é preparado e realizado o golpeinsurreição de outubro só confirma o que já se sabia anteriormente, pela leitura dos textos e a análise da política: que Lênin, e com ele o Trotski que aderiu ao bolchevismo, tinham em mente o projeto de um governo de partido único (na forma e no conteúdo, ou pelo menos no conteúdo). 3. As questões a propósito do pósoutubro são, de certo modo, mais importantes. Como evoluem as relações entre o poder bolchevique e as massas populares, depois de outubro? E como se explica o progressivo fechamento do regime; ele deriva, como se pretende frequentemente, da deflagração da guerra civil?
A marcha do governo bolchevique na direção de uma ditadura de partido único pode ser acompanhada em vários planos. O da autonomização progressiva do Sovnarkom (O Conselho de Comissários do Povo) em relação aos sovietes e ao Comitê Executivo dos Sovietes; o do sufocamento progressivo da liberdade de imprensa; o da repressão contra a pessoa dos representantes da oposição; o da liquidação das instituições de representação popular; o do controle de instituições e progressiva neutralização e depois expulsão dos representantes da oposição nessas instituições; o da constituição de órgãos de repressão. Em todos esses planos, sendo impossível evitar aqui, um toque de ironia, dirseia que a obra dos bolcheviques foi notável. Tudo isso deve ser pensado sobre o fundo das mudanças que se operam na atitude popular diante do novo poder. O fato essencial é a progressiva perda de prestígio do poder bolchevique, e o fortalecimento dos seus adversários, mencheviques e SR. Os acontecimentos principais do período são as eleições para a Assembléia Constituinte, em novembro, a primeira e única reunião da Assembléia, e o seu fechamento, em janeiro. A instituição da Tcheca (a polícia política), em dezembro. Depois, a paz de BrestLitovsk. Finalmente o início da “plena” guerra civil, e a expulsão das oposições do Comitê Executivo dos Sovietes. É preciso começar descrevendo em grandes linhas, e à vol d’oiseau, as práticas autoritárias do novo regime, que vão num crescendo, embora com períodos de recuo, por razões diversas. A imprensa vai sendo progressivamente asfixiada. Primeiro a imprensa liberal, depois, pouco a pouco, a imprensa socialista (SR e menchevique). Mas os jornais fechados, abrem com outro nome.[xxxiv] Há mesmo jornais de direita que, de uma forma ou de outra, conseguem ir sobrevivendo.[xxxv] Há assim uma espécie de guerra de gato com o rato, que dura até o verão de 18. Quanto às prisões (também intermitentes) começase com os liberais, mas em dezembro, muitos socialistas (líderes, inclusive) são presos. No início de janeiro, dois exministros liberais do Governo Provisório são assassinados por marinheiros bolcheviques, no hospital de uma prisão. A Assembléia Constituinte, cuja eleição já estava marcada (os bolcheviques decidem confirmar a data das eleições e realizálas) será fechada na sua primeira e única sessão, em 56 de janeiro. Os bolcheviques não haviam obtido mais do que um quarto dos votos nessas eleições, embora tivessem ganho nas grandes cidades. Os SR saem vitoriosos. Numa das proclamações após a vitória de outubro, os bolcheviques haviam se referido à convocação da Assembléia Constituinte, e eles haviam mesmo justificado a necessidade da derrubada do Governo Provisório, pela necessidade de garantir as eleições para a Assembléia Constituinte. A justificativa do fechamento é em parte geral (os sovietes são formas mais altas de representação – mas logo chegaria a vez dos sovietes...), em parte específica (as chapas dos candidatos SR só minoritariamente haviam separado os SR oficiais dos SR de esquerda). Este último argumento era muito frágil. Como explicaria Rosa Luxemburgo, crítica do fechamento da Assembléia Constiuinte (e também o menchevique Tseretelli, em discurso na sessão única da Assembléia), bastaria dissolver, em vez de dispersar, a Assembléia, e convocar novas eleições (pelo menos lá onde não havia duas listas SR). As manifestações em defesa da Constituinte foram menos poderosas do que se esperava, mas não desprezíveis. Houve uma em novembro, e outra no dia da sessão. A maioria dos participantes era de classe média, mas havia também – discutese quantos – operários. Fato mais importante: a manifestação de janeiro é dissolvida à bala (entre dez e vinte mortos, enterrados simbolicamente a 9 de janeiro, aniversário do Domingo Sangrento de 1905). Era a primeira vez em que o novo poder abria fogo contra manifestantes.
(fim da primeira parte, continua em “Fevereiro“, número 3) |
fevereiro #
2
ilustração: Rafael MORALEZ
[i]O presente texto foi planejado e
escrito por mim. Mas nos seminários que fizemos em conjunto, nos departamentos
de Filosofia e Ciência Política da USP, em agosto/outubro de 2008 (“a revolução
russa”), e agosto/outubro de 2009 (“totalitarismos”), Cícero
Araújo e eu expusemos e discutimos longamente a história da revolução de
fevereiro e da insurreição de outubro. Mesmo se é difícil precisar o que devo
às discussões do seminário (o tema deste texto é, aliás, um pouco defasado em
relação ao que fizemos lá), a dívida é real: o texto não teria sido escrito, se
não tivesse havido os seminários. Cícero Araújo foi também um dos principais
organizadores do importante “Colóquio internacional – 90 anos de
Revolução Russa” (não confundir com outros colóquios, bem menos críticos,
que acabaram também se rotulando “internacionais”), realizado em
São Paulo (e em Guarulhos) sob o patrocínio do CEDEC, do departamento de
Ciência Política da USP, e da UNIFESP em 2007, e que, entre outros, contou com
a participação dos grandes especialistas das revoluções russas Edward Acton,
Nicolas Werth e Ronald Suny.
[ii]O autor vem estudando a língua russa russo já há alguns
anos, de forma intermitente. Mas, por ora, pelo menos, seus conhecimentos não
lhe permitem trabalhar com as fontes russas originais.
[iii]Se preferir, o leitor poderá omitir os excursos. O texto principal tem continuidade
[iv]Referido por Orlando Figes, A People’s Tragedy, the russian revolution 18911924, Londres, Pimlico, 1996, p. 492493.
[v]Ver Figes, op. cit., p. 3089.
[vi]Rex A. Wade, The Russian Revolution, 1917, New York, Cambridge University Press, 2008 (2005), p. 31.
[vii]Ver Figes, op. cit., p.309.
[viii]Figes, op. cit., p. 493 diz que “na imediações (region) do Palácio de Inverno”, haveria mais
ou menos 10 ou 15 mil pessoas, mas que nem todos participaram da célebre
“tomada”. Pipes protesta, quando o historiador revisionista Sunny
(que, como diz Pipes, é na realidade um especialista na questão das
nacionalidades) afirma que havia 20 mil, no “assalto” ao Palácio de Inverno (ver Pipes. “1917 and the Revisionists”, The National Interest, spring 1993, p. 72).
[ix]“Um organismo (...) indicado pela Conferência Democrática [ver mais adiante] na vã esperança de dar à República
certa forma de legitimidade até a convocação da Assembléia Constituinte“
(Figes, op. cit., p. 467).
[x]Cf. Wade, op. cit, p. 74.
[xi]Ver Figes, op. cit., p 393.
[xii]Ver Figes, op. cit., p. 4656.
[xiii]Carta de Lênin a A.V. Lunatcharsky, 25/3/17, citada por Israel Getzler em Martov, a political biografy of a russian social democrat, Melbourne Cambridge at the University Press, Melbourne University Press, 1967, p. 158).
[xiv]Ver Figes, op. cit., p. 465, e
nota.
[xv]Wade, op. cit., p. 299.
[xvi]Ver Figes, op. cit., p. 367.
[xvii]Edward Acton, Rethinking the Russian Revolution, Londres, Holder Arnold, 1990, p. 159.
[xviii]Ver Howard White, “The
Provisional Governement“, in Edward Acton, Vladimir Yu. Cherniaev e
William G. Rosemberg, Critical Companion to the Russian Revolution, 19141921, Londres, Arnold, 1997, p. 396, e Acton, op. cit., p. 15960
[xix]White, art. cit., in
Acton, Cherniaev e Rosemberg, op. cit., p. 443.
[xx]Ver Acton, op. cit., p. 161.
[xxi]Ver a respeito Allan Wildman, The End of the Russian Imperial Army, vol II, the road to soviet power and peace, Princeton, N.J., Princeton University Press, 1987, p. 89.
[xxii]Ver Wade, op. cit., p. 248.
[xxiii]Ver Wade, op. cit., p. 249;
Figes, op. cit., p. 496; também Vladimir Brovkin, The Mensheviks after October, socialist opposition and the rise of Bolshevik Dicatorship, Ithaca e Londres, Cornell University Press, p. 21 e s., e 70 e s.; e Leonard Shapiro, The Origins of the Communist Autocracy, political opposition in the soviet State,
first phase, 19171922, Londres, The London School of Economics and political Science, 1955, p. 70 e s.. Shapiro informa que havia também um forte setor próbolchevique no interior do Vikhsel.
[xxiv]Brovkin, op. cit., p. 22.
[xxv]Figes, op. cit., p. 499,
[xxvi]Brovkin, op. cit., p. 28, o autor cita a resolução SR de esquerda.
[xxvii]Ver Brovkin, p. cit., p. 32.
[xxviii]Ver Richard Pipes, The Russian Revolution 18991919, Londres, Colllins Harvill, 1990, op. cit., p. 519.
[xxix][xxix] Ib.
[xxx]Ver Brovkin, op. cit., p. 33.
[xxxi]Ver Figes, op. cit., p. 499.
[xxxii]Brovkin, op. cit., p. 3233.
[xxxiii]Ver Figes, op. cit., p. 511.
[xxxiv]Ver Brovkin, op. cit., p. 106. Cf., idem, p. 32.
[xxxv]Ver Pipes, op. cit., p. 324 e
560.
[xxxvi]Ver Nikolai Smirnov, “The Constituent Assembly“, in Acton, Cherniaev e Rosenberg, op. cit.,p. 327.
[xxxvii]Ver ib; e Pipes, op. cit., p. 540.
[xxxviii]Oliver Radkey, Russia Goes to the Polls, the election to the allrussian Constituent Assembly, 1917, Ithaca e Londres, Cornell University Press, 1987 (1950).
[xxxix]Radkey, op. cit., p. 47 e 52.
[xl]Smirnov, art. cit. in Acton,
Cherniaev e Rosenberg, op. cit., p. 327; e Figes, op. cit., p. 507 e 508.
[xli]Ver Radkey, op. cit., p. 40 e
150 (tabelas),; e Smirnov, op. cit., in Acton, Cherniaev e Rosenberg, op. cit., p. 327.
[xlii]Ver os dados fornecidos por Leopold Haimson, no que se refere aos bairros operários periféricos em
Petesburgo, no seu artigo “The Mensheviks after the October
Revolution“, Part I, The Russian Review, an american quarterly devoted to Russia past and present, Cambridge University Press, vol. 38, nº 4, outubro de 1979, p. 456 e s (especialmente p. 471).
[xliii]Ver Smirnov, art. cit., in
Acton, Cherniaev e Rosenberg, op. cit, p. 327.
[xliv]Id, p. 328.
[xlv]O texto citado é de Pipes, op. cit., p. 544. Ver também Figes, op. cit., p. 509. Figes calcula em mais ou menos 50 mil
o número de manifestantes, o que representaria mais ou menos o dobro dos
participantes ativos no movimento de Outubro.
[xlvi]Ver Pipes, op. cit., p. 545.
[xlvii]Ver Smirnov, art. cit., in
Acton, Cherniaev e Rosenberg, op. cit., p. 328, 329.
[xlviii]Lénin, Oeuvres, tomo 26, Paris, Éditions Sociales, Moscou, Éditions du Progrès, 1977, “Thèses sur
l‘Assemblée Constituante”, p. 397 e s..
[xlix]Ver Lénin, op. cit., tomo 26,
“Déclaration des Droits du Peuple Travailleur et Exploité”, p. 445; Figes, op. cit., p. 513; e Smirnov, art. cit., in Acton, Chernaiev e Rosenberg, op. cit., p. 329.
[l]Ver Pipes, op. cit., p. 548.
[li]Ver Pipes, op. cti., p. 543544; e Figes, op. cit., p. 513.
[lii]Ver Pipes, op. cit., p. 551; e
Figes, op. cit., p. 514.
[liii]Ver ib e ib.
[liv]Ver Leopold Haimson, “The
Mensheviks after the October Revolution“, Part III, art. cit., in rev. cit, vol. 39, nº4, outubro e 1980, p. 466.
[lv]Ver id., p. 469476.
[lvi]Id., p. 477479.
[lvii]Ver Pipes, op. cit., p. 453 e
Figes, p. 516.
[lviii]Ver Wade, op. cit., p. 285, e Pipes, op. cit., p. 554.
[lix]Ver Figes, op. cit., p. 516517.
[lx]Ver Smirnov, art. cit., in
Acton, Cherniaev e Rosenberg, op. cit., p. 332.